A asfixia neonatal é uma síndrome clínico-neurológica causada pelo comprometimento da oxigenação e da perfusão tecidual, com consequente hipóxia, isquemia e comprometimento dos órgãos afetados. Eventos adversos que ocorrem ainda na vida intrauterina ou a falha no estabelecimento da respiração espontânea do recém-nascido (RN) nos momentos iniciais da vida são as principais causas de asfixia, que é responsável por grande número de mortes neonatais e pela possibilidade de produzir sequelas neurológicas aos que sobrevivem.
Estatísticas internacionais mostram que, em 2015, ocorreram 5,9 milhões de mortes em crianças com menos de 5 anos de idade ao redor do mundo. Deste total, 2,7 milhões ocorreram no período neonatal, sendo quase 700 mil causadas por eventos relacionados ao parto. Esses números permitem inferir que pelo menos 25% das mortes neonatais são devidas à asfixia, sendo que a maioria delas ocorrem em países mais pobres.
No Brasil, foi realizado um estudo nas 27 Unidades Federativas do País, com inclusão de todos os nascidos vivos com peso maior que 2.500g e sem malformações congênitas, ou seja, recém-nascidos considerados de bom prognóstico. No período estudado (2005 a 2010) ocorreram 10.675 mortes relacionadas à asfixia na primeira semana de vida, 70% delas nas primeiras 24 horas de vida. Os piores resultados foram obtidos nas regiões mais carentes do país.
Esses dados demonstram o impacto da asfixia sobre o prognóstico em curto e longo prazos de neonatos. Por esse motivo e por se tratar de um evento potencialmente evitável, é fundamental que sejam garantidas adequadas condições de assistência às gestantes e aos recém-nascidos.
Estratégias
Entre as estratégias para se evitar ou reduzir os agravos causados pela asfixia perinatal destacam-se a qualidade de atendimento ao pré-natal, a assistência obstétrica adequada à gestante de risco e as boas práticas de cuidados ao RN na sala de parto e durante a internação. Neste contexto, os procedimentos de recepção e de reanimação neonatal e os cuidados pós-reanimação são de fundamental importância na assistência do RN com asfixia.
Primeiro minuto de vida
Sabe-se que em torno de 10% dos RN de termo e mais que 60% dos prematuros necessitam de ventilação pulmonar na sala de parto para o restabelecimento da respiração. Quando esse procedimento é realizado por profissionais treinados, com técnica adequada e dentro do primeiro minuto de vida, a maioria dos recém-nascidos recuperam a vitalidade.
Evidências científicas comprovam que o treinamento adequado dos profissionais que assistem o RN na sala de parto, por meio de programas de reanimação neonatal, tem impacto positivo na redução da mortalidade. Dado relevante é que, em apenas 50% dos casos, a necessidade de reanimação é “prevista”, o que reforça a importância do treinamento da equipe de assistência, que deve estar preparada para realizar os passos da reanimação em qualquer situação.
Além da reanimação em sala de parto, é crucial que esses pacientes sejam cuidadosamente monitorados de tal forma que os problemas mais comuns relacionados à asfixia sejam precocemente detectados e o tratamento seja rapidamente instituído. Especial atenção deve ser dispensada para o controle térmico, adequada hidratação, oferta de nutrientes e manutenção do equilíbrio metabólico do RN. Ao mesmo tempo, a equipe de assistência deve ser capaz de identificar os casos de maior gravidade, como aqueles que requerem suporte neurológico, respiratório ou tratamento de infecções.
“Hora de Ouro”
Esse conjunto de cuidados e atitudes, cujos objetivos são restabelecer prontamente as condições de vitalidade do RN imediatamente após o parto e garantir sua estabilidade clínica na primeira hora pós-parto, conceitua a chamada “Hora de Ouro”. Estudos mostram que uma assistência neonatal realizada de forma organizada e sistematizada na primeira hora de vida tem impacto positivo no prognóstico do paciente.
Evitar a asfixia perinatal e oferecer uma assistência neonatal de qualidade são medidas prioritárias que, certamente, contribuirão para a redução da mortalidade neonatal e das sequelas em longo prazo, garantindo, assim, a possibilidade de um futuro melhor aos pequenos e suscetíveis recém-nascidos.
Autor: Prof. Dr. João Cesar Lyra, Livre-Docente em Neonatologia (UNESP), coordenador da Pós-Graduação em Neonatologia e professor da Pós-Graduação em Pediatria da Faculdade IBCMED.