Em média, um estudo identificou que ao longo da vida 26% das mulheres teriam desenvolvido ao menos um episódio depressivo maior, em comparação com 11% dos homens. Mais recentemente, identificou-se que, a cada intervalo de um ano, 4% dos homens e 10% das mulheres apresentaram um diagnóstico clínico de depressão, com intenso sofrimento e/ou prejuízos sociais e econômicos. É claro que se a cada ano um grupo diferente de 10% das pessoas adoecesse de depressão, em 10 anos, 100% das pessoas teriam sofrido de depressão – e isto não acontece. O fato é que as pessoas que sofrem de depressão comumente atravessam múltiplos episódios depressivos, e alternam períodos em que estão bem e períodos em que voltam a adoecer.
Neste mesmo estudo, sintomas depressivos leves, sem graves prejuízos ou sofrimentos, ou sem um diagnóstico clínico firmado, atingiram, outros 6% e 10%, de homens e mulheres, respectivamente. Na medida em que ingressamos nas idades mais avançadas, a presença da depressão intensifica-se, chegando a 25% do total das pessoas a qualquer momento, independente do sexo, sendo os homens mais impactados pelas incapacidades e inabilidades que se desenvolvem e se acumulam, de acordo com dados italianos publicados em 2014.
Os mais antigos testemunhos escritos da existência da doença depressiva datam de 4 mil anos atrás, de antigos textos mesopotâmicos, da época do Rei Hamurabi da Babilônia. Já então a depressão era descrita como uma condição incapacitante, perigosa, e que representava algo estranho à pessoa que nela se instalava tomando conta de sua personalidade, entendido, como hoje, como um problema espiritual – ou psíquico – tratada então por sacerdotes, a quem se atribuíam poderes mágicos/como, hoje, por cientistas e médicos do espírito (a tradução mais exata para “psicológos” e “psiquiatras”, respectivamente), a quem se atribuem “poderes científicos”. Equivale a dizer que a doença depressiva já era conhecida pelo homem nos primórdios da civilização humana.
Mas por que mulheres adoecem mais? É a depressão das mulheres semelhante à dos homens? São diversas suas complicações? São diferentes
as respostas aos tratamentos?
Em primeiro lugar há de se reconhecer que, por mais que as estatísticas mostrem peculiaridades em relação aos sexos, não se pode absolutamente, como se fez no passado com as histerias, afirmar que a Depressão é uma doença de mulheres, posto que é também muito frequentemente em homens. Comparando-se homens e mulheres depressivos, observam-se nas mulheres uma prevalência levemente maior nos sintomas depressivos típicos, incluindo alterações no humor, no apetite, no peso corporal, bem como no sono – para mais ou para menos. Nos homens, por outro lado, são mais comuns problemas associados, não essencialmente depressivos, mais bem complicações, como impulsividade, comportamentos perigosos em geral, além do abuso de álcool e drogas.
Esta diferença se expressa mais claramente, talvez, no risco de autoextermínio associado à depressão – de 2,5-4 vezes maior nos homens do que nas mulheres, enquanto nas mulheres o risco das tentativas de suicídio é maior (também, de 2-4 vezes maior do que nos homens), com suas sequelas.
Ou seja, se é de fato substancialmente maior a prevalência de depressão entre as mulheres (2,6:1), o perigo e a urgência que devem acompanhar seu tratamento em homens talvez devam ser considerados em geral maior. Analisando-se, por outro lado, portadores do assim chamado Transtorno Borderline de Personalidade – grave quadro crônico caracterizado por instabilidade do humor, do comportamento e de atitudes face ao mundo, os outros e a si mesmo, e em especial grande impulsividade – alguns estudos indicam como duplamente mais frequente em mulheres, outros como igualmente prevalentes, e outros ainda apresentam prevalências que julgamos inconsistentes (o dobro de t. Borderline em mulheres, com equiprevalência dos transtornos de personalidade narcisista e histriônico entre os sexos). Entretanto, as diferenças entre homens e mulheres portadores de Depressão quanto aos riscos sociais e pessoais, foram estatisticamente insignificantes. Isto sugere o que manda o bom senso: que, mais importante do que o sexo, ao indicarem-se o pronto e devido cuidado psiquiátrico dos pacientes, é a gravidade dos sintomas e de suas complicações.
Referências:
*Dr. Sander Fridman – professor da Pós-Graduação lato sensu em Psiquiatria da Faculdade IBCMED. Possui experiência em neuropsiquiatria, psicanálise cognitivista e psiquiatria forense. Mestre e Doutor em Psiquiatria pela UFRJ.
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