Com início em 2009, a campanha anual de prevenção ao suicídio, movida internacionalmente pela Organização Mundial da Saúde, está completando 10 anos. Para 2019, o Ministério da Saúde enfocará a prevenção do suicídio em crianças e adolescentes.
Crianças como vítimas de suicídio e tentativas são uma população particularmente distinta da dos adolescentes e adultos. O risco não é maior no sexo masculino, podendo ser até mesmo maior em meninas, como em estudos na Tunísia e em Portugal. A prevenção não se beneficia da atenção gerada por tentativas prévias, pois crianças não apresentam comumente tentativas de suicídio anteriores. Por outro lado, condutas automutilatórias (cortar-se nos braços, nas pernas) são fortes indicativos nesta faixa etária do risco de suicídio. Como desencadeantes de tentativas de suicídio em crianças, predominam lares tensos e disfuncionais e dificuldades de relacionamento na escola, associados a intenso sentimento de solidão. Sintomas de transtorno de déficit de atenção, em crianças, depressão crônica ou grave, em adolescentes, superdotação intelectual com dificuldades importantes de ajuste social, em ambos, são fatores psicossociais comumente associados ao risco de suicídio, e deve merecer especial atenção afetivo-emocional.
É o Bullying ou Assédio Escolar provavelmente um dos principais determinante de tentativas de autoextermínio em crianças e adolescentes com dificuldades de ajuste social. Mas merecem ainda especial destaque as crianças e adolescentes com espectro autista muito leve, cujas dificuldades de interação social-recíproca são facilmente perceptíveis e rechaçadas, rejeitadas, sem a devida tolerância e apoio que recebem as crianças nitidamente doentes, seja de seus pares, seja da estrutura pedagógica – sendo não raro vítimas de um verdadeiro massacre punitivo, à guisa de correção.
A restrição histórico-cultural das vivências de interação social direta, em detrimento das interações sociais mediadas por ambientes virtuais (jogos digitais e mídias sociais), pode estar na raiz de uma intensificação do sentimento de solidão e de dificuldades e frustrações à administração das dificuldades das interações sociais. O desenvolvimento das comunicações sociais, por outro lado, pode servir de recurso social e afetivo aceitável para crianças e adolescentes que, sem estas, não teriam acesso a outra forma de interação social afetiva.
O tratamento com enfoque também nos pais pode ser indispensável na prevenção do suicídio em crianças e adolescentes, por ser o mau relacionamento em casa, aparentemente, seu principal e controlável fator desencadeante.
Em todas as idades, a disposição para ouvir, interação social, expressões de valorização mútua, tempo dedicado à interação, disposição para perdoar e pedir perdão, serão sempre relevantes na prevenção das tendências autoextintivas.
É da maior importância a busca imediata por ajuda profissional adequada, seja pelo paciente, seu familiar, seu apoio social ou escolar, juntos ou isoladamente, uma vez identificado o risco – grosseiramente, a existência de ideias de que “seria melhor dormir e não mais acordar”, “de sair por aí e ninguém nunca mais me ver”, “não ser mais um peso”, “seria bom seu eu morresse de alguma coisa”, ou de fazer algo para abreviar a vida.
Uma vez iniciado o tratamento, é importante que seja mantida a atenção e o arranjo social de apoio e proteção, bem como a comunicação com o psiquiatra, até que a crise tenha sido completamente esbatida.
Autor: Dr. Sander Fridman é professor da Pós-Graduação lato sensu em Psiquiatria da Faculdade IBCMED. Possui experiência em neuropsiquiatria, psicanálise cognitivista e psiquiatria forense. Mestre e Doutor em Psiquiatria pela UFRJ.