Quantas pessoas você já viu nascer? Um irmão, um filho, um sobrinho? E quando este número passa de cem? De quinhentos? Se aproxima de mil partos? É um volume grande, certamente, ainda mais se estivermos falando em cidades muito pequenas, onde a maior, Itapajé (CE), tem, no máximo, 60 mil habitantes. Esta história faz parte da rotina do Dr. Rodrigo Ferreira Gomes, de 32 anos, que até já perdeu a conta da quantidade de crianças que ajudou a colocar no mundo. Há quase sete anos, ele, que sempre gostou de Ciências e Biologia, se formou em Medicina pela Universidade Federal do Ceará e direcionou a sua carreira para trabalhar com a saúde da família.
Ao invés de clínicas, Dr. Rodrigo optou pelo Serviço Público e atua como plantonista em Postos de Saúde no interior cearense; uma região muito carente e com uma população extremamente simples e desprovida de bens materiais. O que, definitivamente, não faz diferença para o jovem médico. A sua vocação é ajudar. Sente-se feliz contribuindo para com o próximo, independentemente do pagamento da consulta. E trata a todos de forma cordial e carinhosa. “O Nordeste é uma região em que se tem muitas pessoas boas de coração. Cultivo muitas amizades com meus pacientes. De igual para igual, sem privilégios ou interesses financeiros. O povo aqui é muito humilde, mas tem o coração nobre! Só conhecendo para sentir isso”, garante.
“Se meus amigos até para beberem água têm dificuldade, quem sou eu para tratar mal qualquer paciente, sendo ciente de toda a dificuldade enfrentada?”, questiona. No final do ano passado, mesmo tendo sido demitido da Maternidade em que trabalhava, buscou uma mesa e duas cadeiras e foi atender aos seus pacientes na calçada mesmo. Achou que eles não deveriam ser prejudicados por uma decisão inesperada da entidade hospitalar. O fato ganhou repercussão nacional. Ele acabou sendo protagonista de diversas matérias e vídeos que ainda circulam na Internet. E outra curiosidade pontua esta narrativa. O terreno onde, justamente, está a Casa de Saúde foi doado por um tio-avô do Dr. Rodrigo e a Maternidade leva o nome de João Ferreira Gomes, que era empresário. Mas, segundo ele, uma coisa não tem relação com a outra. Ele defende que a demissão está relacionada a questões políticas.
Pós em Geriatria e Gerontologia
Entretanto, sem entrar no mérito desta decisão, mas comovida com iniciativas como esta, em favor do próximo, especialmente do paciente, a Diretoria do IBCMED concedeu uma bolsa integral de estudos ao Dr. Rodrigo Ferreira Gomes. Neste segundo semestre, ele inicia a Pós-Graduação lato sensu em Geriatria e Gerontologia do IBCMED, na sede localizada em São Paulo. “Esta Pós deverá abrir novos horizontes para mim”, disse ele, observando que esta é a hora certa de voltar a estudar. Isso que o Dr. Rodrigo tem uma rotina já bastante agitada.
Além de atender em sua cidade natal, Itapajé, também vai com seu carro até os municípios de Tejuçuoca e Irauçuba. Muitas vezes, aceita – meio constrangido – só um cafezinho em troca do atendimento feito. Também dá palestras e faz campanhas variadas em prol da saúde, sobre a prevenção do câncer de próstata e mama e também de cuidados com o bebê, por exemplo. Algumas até nas praças, embaixo das árvores. Tudo de maneira muito simples e direta, falando a linguagem que o seu paciente irá compreender.
Tratamento humanizado
“Vejo que, para se ter uma boa prática na Medicina, é preciso saber que tratamos de pessoas e não de doenças. Cada paciente tem sua história de vida e cultura local; quanto mais o(a) médico(a) se aproxima, respeita isso e se comunica de forma que o paciente entenda o que é dito, maior a confiança, empatia, e, consequentemente, a aderência ao tratamento prescrito”, avalia.
“Estou fazendo um trabalho de
formiguinha, mas é prazeroso.”
E a realidade do povo nordestino é complicada. “Não imagina o quanto é difícil orientar uma dieta e prescrever medicações para quem não dispõe, por inúmeras vezes, das medicações prescritas e tem apenas rapadura, feijão e carne do sol para comer. Como orientar repouso para quem depende do seu trabalho braçal para pôr comida no prato da família? É uma tarefa que demanda afinidade, amizade e o jeitinho cearense de resolver as coisas. Não sabe ler? Fazemos cartelas com imagens de como deve ser tomada aquela medicação: para as medicações diurnas, leva um desenho de um sol, para as noturnas, a de uma lua”, explica Dr. Rodrigo.
Mas nem por isso este profissional exemplar perde o seu bom-humor. “Assim, se segue a vida de médico no interior do Ceará. Com muitas dificuldades, porém, muitas alegrias. A cada parto bem-sucedido, a cada nível glicêmico ou pressórico controlado, uma vitória. Vitória contra as dificuldades e contra as patologias que afetam nossos pacientes e irmãos nordestinos, comemora. “Não faço nada que os outros não possam fazer. Basta querer, pois remuneração já temos o suficiente para isso”, argumenta com altruísmo. “Estou fazendo um trabalho de formiguinha, mas é prazeroso.”